sexta-feira, agosto 27, 2010

da gorgonização do amor.

Eu costumava andar por campos de girassóis, apreciando a cor dourada do pôr do sol, hora em que você costumava sair para dançar entre as flores, sorrindo e girando para saudar a noite iminente. Bailava entre o brilho dos vagalumes, e era para mim a visão mais reconfortante e compensadora de todas, te ver ali feliz a sorrir e cantar, o coração pleno de alegria. Naquele breve momento, eu te amei primeiro.
E então você me viu, e seu semblante mudou. Você acelerou o passo, girando rápido, espantando os vagalumes e derrubando os girassóis. Eu não entendia a razão da sua fúria, queria te abraçar e dizer que não, que era tudo simples, que bastava para mim te ver dançar. Queria te pegar no colo e cuidar dos teus delírios, mas você trouxe a tempestade. Ela chegou no início da noite sem lua, com seus ventos de egoísmo e trovões de insegurança, e de repente não havia mais campo, não havia girassóis e vagalumes. Súbito, o que dançava agora eram cinzas e destroços, varrendo os campos sem luz onde antes havia amor. Eu quis gritar, mas você levou a minha raiva. Quis chorar, mas não havia mais dor. Nunca mais flor, dança, alegria.
Veio a chuva, como lágrimas derramadas tarde demais, e as cinzas dos campos se mesclaram à agua, o cheiro da terra queimada virando lama, tudo sujo, sujo, sem vida. Você foi embora, levou consigo meu amor pelas coisas do mundo, e agora eu adorava aquela podridão, aquela sujeira impregnada em meu corpo. Eu quis gritar, mas a lama me sufocava, me privando de voz, visão, movimento. Cessou a chuva, a noite se foi e a alvorada não trouxe consolo algum a uma estátua num campo de cinzas.

3 comentários:

dansesurlamerde disse...

ai, ai.

beijo.

Bruno Ribeiro disse...

Muito legal! Gostei do estilo da sua escrita! E obrigado pelo comment no Cafe Samedi, fique a vontade para participar!

cafesamedi.wordpress.com

Gabriela Deptulski disse...
Este comentário foi removido pelo autor.